26/05/2021
CIEJA Campo Limpo, EMEF Campos Salles, Elvira Brandão e tantos outros nomes cuja simples menção remete à inovação na educação. E o indiscutível papel que os gestores pedagógicos destas escolas desempenham na transformação de suas comunidades educativas. Mas qual a relação entre o movimento identitário destes sujeitos, desde suas formações até suas trajetórias pessoais, e os processos de inovação que integram e fomentam?
Foi esta pergunta que norteou a investigação de Alcielle dos Santos em sua tese de doutorado “O movimento identitário de gestores de escolas inovadoras da cidade de São Paulo: investigação e ensinamentos para a sua formação”, realizado pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. “A premissa para este trabalho surgiu da minha própria experiência profissional. Eu era coordenadora pedagógica e queria fazer uma pesquisa que me apoiasse em meu desenvolvimento profissional”, conta.
Com esta perspectiva, Alcielle elegeu gestores de três escolas inovadoras na cidade de São Paulo – as públicas CIEJA Campo Limpo e EMEF Presidente Campos Salles e a privada Colégio Elvira Brandão – e passou a acompanhá-los a partir das cinco dimensões de uma organização inovadora (gestão, currículo, metodologia, ambiente e intersetorialidade), estabelecidos pela Iniciativa para Inovação e Criatividade do MEC, em 2015, e incorporados pelo Movimento de Inovação na Educação.
A pesquisadora conta que este grupo de três escolas trazia díades interessantes que poderiam se traduzir em boas perspectivas de análise de contexto: rede pública/rede privada, Educação Básica/Educação de Jovens e Adultos, inovação em processo/inovação desde a concepção da escola. “E principalmente traziam em seus históricos de inovação e criatividade gestores com trajetórias significativas, que poderiam me encaminhar a responder à questão central desta pesquisa”, conta.
Além de investigar o movimento identitário dos gestores pedagógicos em termos da sua constituição (formação e profissionalidade) e dos processos de gestão de suas escolas, a investigação também analisou em que medida esses sujeitos lidavam com atribuições e pertenças em seus movimentos identitários, como gestores de inovação, dentro dos parâmetros do sistema educacional.
Para tanto, Alcielle partiu de duas hipóteses iniciais. A primeira que estes atores atuam como tradutores da inovação para a comunidade escolar. A segunda, a de que há relação entre os processos de inovação e movimento identitário destes sujeitos. “Queria entender porque alguns gestores resolvem fazer do seu trabalho um projeto de vida. Então fiz a observação e diversas entrevistas para saber sobre suas trajetórias de vida”, conta.
Entre os achados da pesquisa, está a corroboração das hipóteses mencionadas: os movimentos de inovação passam, necessariamente, pelos gestores que atuam como tradutores desses processos e há relação entre inovação e movimento identitário dos gestores desses processos.
“A análise mostrou que a trajetória pessoal e acadêmica de todos os quatro sujeitos observados [No CIEJA Campo Limpo, participaram ex-diretora e atual diretor] abarcavam uma grande diversidade tanto em termos de formação profissional quanto de vivências pessoais. Nenhum deles é, por exemplo, só pedagogo. E em suas experiências aparecem muito fortemente a questão da colaboração como valor, da abertura para o novo, da coletividade, da disposição de aprender com o diferente. Outra coisa que eles tinham em comum é a grande valorização e a alegria no ato de estudar”, conta Alcielle.
Em outras palavras, o movimento de mudança, presente nos cenários de inovação, também se fazia presente nas trajetórias pessoais e profissionais dos quatro gestores. A análise revelou ainda como o movimento identitário dos gestores relaciona-se ao pertencimento local, o que os legitima em suas funções para além da atribuição institucional de seus cargos. “Marcas culturais dos sujeitos pesquisados coincidem com as das escolas em que atuam, demonstrando que há um diálogo, também, no âmbito do desafio cultura”, diz o texto.
No âmbito das trajetórias profissionais, a pesquisa destaca a comunicabilidade desta com a trajetória pessoal e acadêmica nos percursos dos quatro gestores. A atração por cenários complexos e desafios, além da facilidade de mobilizar interesses e repertório pessoal nos processos de inovação liderados, se fizeram presente nas falas de todos os entrevistados.
Quando o tema era “gestão da inovação”, notou-se ainda outros pontos em comum: a escolha de modelos de gestão democrática por todos os quatro gestores, manifestando o entendimento de si como articuladores, mobilizadores, animadores, e não como lideranças autocráticas, e a abertura a inovações apoiadas por outros atores (aliados), que agem concomitantemente.
A investigação também se preocupou com o que vinha sendo feito para a continuidade do projeto inovador. Quando questionados sobre “que estratégias adota/adotou para que o projeto liderado por você não se perca/perdesse e, ao mesmo tempo, esteja aberto a outras inovações?”, alguns ensinamentos merecem destaque como a importância de se estabelecer um núcleo da rede sociotécnica, que seguirá a atuar na tradução do processo de inovação educativa implementado, mesmo após o encerramento da atuação do gestor seja por mudanças de vínculo empregatício ou mesmo devido à aposentadoria.
Segundo Alcielle, estas conclusões suscitadas pela tese embasam a necessidade de considerarmos essas experiências inovadoras exitosas, do ponto de vista da gestão, para gerar ensinamentos para outras redes. “O discurso da mudança está muito imbricado na nossa sociedade. Todo mundo diz querer o novo, a educação do século XXI, mas não sabe como ou que mudar. Minha defesa é que esse movimento se constitua a partir das experiências bem-sucedidas destas escolas inovadoras. Por isso, defendo na tese que usemos o mesmo ponto de partida da minha investigação, que é a política pública do MEC do Mapa de Inovação e Criatividade na Educação Básica”, diz.
Ainda nesta perspectiva de expansão, a pesquisa destaca a importância da dimensão da intersetorialidade, investindo-se na articulação das escolas com outros equipamentos sociais das áreas de educação, cultura, saúde e assistência social, para que possam estimular outros processos de inovação educativa. “”A tese traz mapas de São Paulo, localizando escolas inovadoras no Brasil e na capital paulista, assim como as três escolas estudadas e a rede de equipamentos do entorno. É um convite para que outras escolas façam movimentos de inovação educativa e para as redes de educação terem essas escolas como referências”, diz a pesquisadora.