18/06/2021
Falta de espaço para aprender e praticar a cidadania, necessidade de construir canais de comunicação entre instituições tradicionais e as juventudes e tantos outros desafios para a efetivação da participação política dos jovens foram compartilhados na live de lançamento do mapeamento “Jovens Transformadores para o Futuro da Democracia”, que ocorreu nesta última quinta-feira, dia 17/06, sob a mediação do jornalista Leonardo Sakamoto.
Tendo envolvido 123 empreendedores sociais e Jovens Transformadores da América Latina da Ashoka, o mapeamento, realizado com o apoio da Open Society Foundations, também aponta as inovações sociais em curso para promover o protagonismo das juventudes nos processos democrático e tomadas de decisão.
Na conversa de lançamento, Iago Hairon, conselheiro do Engajamundo, compartilhou algumas reflexões suscitadas pelo estudo e também pela sua vivência enquanto ativista. “A gente vem percebendo uma desconexão, principalmente das novas gerações, com as formas mais tradicionais e institucionais de participação, em toda a América Latina. E vemos também, cada vez mais, movimentos de populações sendo fortificados e criando espaço na sociedade. Podemos apontar como exemplo o que estamos vivendo no Brasil ou a nova Constituição no Chile – todos esses processos são puxados por pessoas que não se sentem representadas. É isso que este estudo mostra, assim como possíveis soluções para se engajar nestas novas formas de participação”, explica.
Sobre o desafio de construir canais de comunicação entre instituições tradicionais e as juventudes, a jornalista Mariana Belmont pontuou: “As instituições não estão preparadas para receber opiniões, olhares das juventudes, principalmente, a negra e periférica. Estes espaços são ocupados historicamente por homens brancos que têm um modo de fazer colocado, então quando vem algum jovem de outro olhar, de origem mais popular, gera uma desconfiança, uma disputa. E isso reforça a importância de ocupar, de trazer nossa narrativa.”
Juliana Marques, co-fundadora do Movimento Mulheres Negras Decidem, por sua vez, falou sobre algumas das causas por trás da ainda pífia participação de mulheres e homens negros na esfera política institucional. “O fato de que a cada 23 minutos, um jovem negro morre no Brasil, traz uma dimensão de que, antes de mais nada, a nossa capacidade de pensar política está muito voltada para a estratégia de sobrevivência. Nosso direito à vida é negado, então fica difícil pensar, às vezes, em engajamento cívico dos jovens, não porque não reconheçam a importância deste espaço, mas por conta de todos essas discriminações que no atravessam.”
O racismo estrutural também pautou a fala de Wesley Teixeira, idealizador do Movimenta Caxias. “Criar espaços para a nossa participação não é nenhuma novidade, a gente faz isso desde os quilombos. Só fomos votar em 1988, então sempre tivemos que permear esta democracia que é estruturada pelo racismo.” Daí a importância dos territórios como espaços de construção cidadã e de ocupar a mídia. “O povo sabe do que precisa, ele tem voz, ele precisa é de ouvidos.” A esta perspectiva, Gelson Henrique, cientista social e idealizador do CIJoga – Caravana Itinerante da Juventude, somou: “O fortalecimento democrático precisará ser preto, popular e plural – ou não irá ser. Não existe democracia sem os nossos corpos”.
Em sua fala, Aquataluxe Rodrigues, da Comissão da Juventude do Olodum, observou ainda: “Sou de uma cultura que entende que não existe o futuro sem o mais novo. Pensar democracia sem pensar juventude negra, sem pensar em todos que foram excluídos, não é democracia. Precisamos sair dessa heteronormatividade branca, que são homens e mulheres brancas falando o tempo inteiro por nós. Porque nossa comunidade sabe exatamente o que quer.”
Ana Paula Freitas, advogada e coordenadora de Programas da Rede Liberdade, falou sobre seu trabalho no Instituto de Defesa da População Negra, do qual é co-fundadora. “Dentro do Instituto, a gente não só faz a defesa de pessoas negras, como também proporciona um trabalho de mentoria e formação para advogados negros recém-formados para que possam entrar de forma qualificada no mercado de trabalho. Então é um trabalho de, com e para pessoas pretas.”
Para falar sobre como a participação juvenil se materializa em territórios indígenas, Ednei Arapiun falou sobre o Conselho Indígena Tapajós Arapiuns, do qual é coordenador. “Nós temos um departamento de jovens que faz articulações e formações, por exemplo, sobre legislação indígena e nossos direitos e levam isso para dentro das aldeias porque o governo só ludibria a população indígena, conta mentiras que todos irão se beneficiar e, na verdade, ficamos sem nada.”
No âmbito dos territórios quilombolas, Isabela da Cruz, ativista pela promoção dos direitos das populações quilombolas, compartilhou as seguintes contribuições: “Além da luta pelo território, uma das maiores dificuldades nos contextos rurais é o acesso aos meios de comunicação, às tecnologia pela falta de políticas públicas e de garantia desses direitos. A gente começa na corrida dois passos atrás.”
Questionado sobre o que seriam habilidades transformadoras e como elas podem favorecer o engajamento dos jovens, Bruno Souza, fundador do Núcleo de Jovens Políticos, elencou algumas: a importância de sonhar, isto é, de repensar realidades; a responsabilidade pelo mundo e a cooperação. Sobre esta última explicou: “Acho que a gente tem o entendimento equivocado de que cooperar é estar com pessoas que pensam como a gente. E quantas vezes eu e colegas, por sermos jovens, já entramos em lugares e as pessoas só de olharem para nossas caras pensaram que não tínhamos currículo suficiente? Então, para mim, cooperação é ver estas possibilidades de outras narrativas, de interação.”
Participaram ainda do encontro Ivana Bentes, professora Titular da Escola de Comunicação da UFRJ, e Helena Singer, doutora em Sociologia pela Universidade de São Paulo.