22/07/2019

Com yoga e meditação, creche estimula desenvolvimento integral das crianças

O sol da manhã reflete em cortinas alaranjadas e deixa o ambiente com luz aconchegante. Em silêncio, as crianças fecham os olhos por alguns minutos. A atividade faz parte de uma aula de meditação do Centro de Educação Infantil Lar de Crianças Ananda Marga, localizado no Jardim Peri, bairro na periferia da zona norte de São Paulo (SP).

“Tia, o meu coração está aquecido”, diz uma menina, no fundo da sala, assim que acaba a atividade. Isso porque, antes de começar a aula, cada criança recebeu um coração de papel. Por alguns instantes, de olhos fechados, tiveram que pensar em pessoas para compartilhar o seu amor. “Eu lembrei minha família”, completa outro garoto.

Quem conduz a atividade é o educador Al Crisppinn, mais conhecido pelas crianças como Tio Al. “Eu procuro desenvolver uma atividade que seja lúdica e agradável para as crianças. Também trago muito as minhas informações”, diz ele, que é um praticante de yoga, artista e também bailarino. Durante as aulas, as histórias e a forma de falar, quase teatral, também são estratégias para envolver a turma. Tudo isso enquanto são trabalhados valores como respeito, compaixão e cooperação.

cei ananda marga

 

Além da prática de meditação, a creche oferece shantala (massagem indiana), yoga, teatro e alimentação vegetariana para cerca de 130 crianças. Conveniada à Prefeitura de São Paulo, a instituição é administrada pela ONG internacional Amurt-Amurtel, que se baseia em um currículo neo-humanista para propor atividades pedagógicas que estimulam o desenvolvimento integral das crianças, considerando suas dimensões física, cognitiva, afetiva e social.

“Eu gosto daqui, mas vou embora pra creche de criança grande”, conta Giovana, 4, que no próximo ano vai para pré-escola. Já o seu colega de turma, Júlio César, 4, não hesita em contar que as suas aulas preferidas são as do Tio Al. “Eu gosto de fazer as posturas”, diz o menino, fazendo menção às aulas de yoga.

Para estimular o respeito ao próximo e o senso de comunidade, todos os dias pela manhã as crianças participam do Círculo do Amor, atividade em que são convidadas a cantar e conversar sobre fatos de suas vidas. “Depois do Círculo do Amor, contamos tudo o que vai acontecer durante o dia. Isso acontece sempre, sendo shantala ou qualquer outra atividade. Antes de começar, explicamos o que será feito”, diz a professora Valesca Pompeu, que está há dois anos na creche.

cei ananda marga

Além de envolver as crianças em todas as atividades que serão desenvolvidas ao longo do dia, a educadora conta que o acolhimento é fundamental para o trabalho da creche. “Quando elas chegam, o período de adaptação é um pouco complicado porque estão perdendo pela primeira vez o contato com a família. Então nós construímos vínculo com muito carinho , sempre respeitando o tempo de cada uma”, explica Valesca.

Os interesses das crianças também são respeitados e materializados nos projetos desenvolvidos pelo CEI Ananda Marga. A instituição parte de um trabalho sobre identidade e história da família, para depois trabalhar a relação com o meio ambiente e com as outras culturas.

Na turma da professora Giselle Souza, com idades entre 3 e 4 anos, as crianças estão estudando a Polinésia Francesa. O interesse pelo conjunto de arquipélagos no Oceano Pacífico veio depois que as crianças assistiram ao desenho Moana, da Disney. “O filme fala muito da valorização do lugar de onde cada um veio, da importância da natureza e do alimento. Nós tentamos fazer a criança se perceber e entender que ela faz parte de um contexto. Não é só ela, tem um mundo ao redor, ela pertence a um espaço”.

cei ananda marga

Ao entrar na sala da professora Ireni Pereira, também com crianças entre 3 e 4 anos, após a reportagem do Porvir ser recebida com a saudação indiana Namaskar, a canção indígena entoada pela turma dava pistas do projeto trabalhado. Eles estavam estudando o povo Munduruku, originário do Pará, mas que por questões de terras migraram para o Amazonas.

Inspirado em um livro infantil, o trabalho serviu como pano de fundo para conhecer a localização dos estados no mapa, falar sobre resistência dos povos indígenas e aprender novas canções e ritmos. “Foi uma coisa que nasceu realmente da curiosidade e indagação deles. Eu não estava pensando em falar sobre os índios, mas os projetos sempre levam em consideração a fala e os interesses das crianças, conta a professora Ireni, ao mencionar a história também serviu de pano de fundo para trabalhar a questão alimentar.

Aliás, a alimentação também é outro destaque da escola, que conta com um cardápio vegetariano composto de legumes, verduras e frutas. No dia em que o Porvir visitou o local, o menu do almoço era macarrão, arroz, feijão, abobrinha ralada com proteína, grão de bico, tomate, alface e beterraba. Já de sobremesa, fatias de melancia.

Uma das responsáveis pelas refeições é Rosângela Marques, que trabalha na creche há dez anos. “Aqui eu aprendi a preparar muitos alimentos, como o tofu e a proteína de soja. Tudo tem que hidratar, cada alimento tem um segredo, mas o principal é o amor e o carinho para oferecer para as crianças, e também e os adultos”, ressalta.

“Nossa intenção não é colocar na cabeça da criança que ela não pode comer carne. Isso tem que ser uma opção dela. O que nós queremos é oferecer uma alimentação de qualidade” destaca a coordenadora Carmem Queiroz da Silva. “A educação humanista fala do ser humana como um todo. A nossa intenção é chegar na criança para ela poder chegar na família”, menciona.

Há um ano no comando da instituição, a diretora Maria Bernadette Piccolo avalia que o trabalho desenvolvido pela instituição se reflete no clima escolar. “Quando eu cheguei aqui me chamou muita atenção a tranquilidade das crianças. Claro que tem conversa, criança é criança, mas aqui é diferente”, diz a gestora que também se preocupa em trabalhar as relações entre a equipe. No entanto, ela reconhece que meditação, shantala, yoga, teatro e alimentação vegetariana não são os principais pilares da escola. “Nosso maior destaque é a questão humana e o respeito à dignidade.”

Texto publicado originalmente no Porvir

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