Todo ano, a Calourada da USP dá as boas-vindas aos novos estudantes da universidade com uma série de debates e atividades culturais. E 2018 foi um ano especial: o primeiro com ingresso por cotas raciais e sociais na USP – conquista histórica do movimento negro no Brasil.
Negra, nascida na periferia e estudante de Ciências Sociais na universidade, Midria da Silva Pereira, de 20 anos, pensava então em como poderia recepcionar esses jovens recém-chegados. Ao lado dos colegas de graduação, Ian Douglas e Ygor Peniche, teve a ideia de organizar um slam: competição de poesia falada na qual os poetas recitam versos de sua autoria que são, posteriormente, avaliados por jurados.
“Quando rolou o slam na Calourada, foi muito legal e acolhedor. A ideia era só fazer aquele, mas aí vieram convites de outras instituições e cursos para fazer outras edições e entramos no circuito”, conta Midria.
Assim nascia o “USPerifa – Núcleo de Culturas Periféricas” com o objetivo de trazer a cultura negra e da periferia para dentro da universidade. “O slam é um espaço múltiplo e de acolhida, onde todo mundo pode ter voz. Qualquer pessoa pode participar do slam. Você só precisa do seu corpo e de suas palavras. Além disso, por conta da plateia, o slam é muito mais um espaço de escuta do que de fala”, explica a estudante.
Uma das mais prestigiadas universidades do Brasil e do mundo, a Universidade de São Paulo (USP), apesar de pública e gratuita, se mostra ainda inacessível para grande parte da população.
“Quando começamos a organizar os slams, uma das coisas mais legais foi trazer pessoas de fora da universidade para dentro, fossem poetas ou espectadores. Muitos não conheciam a USP, não sabiam que era pública e que podiam frequentar lá quando quisessem”, conta Midria.
Parte do público dos slams está também entre os jovens que frequentam os cursinhos populares da região. “Para nós, é muito importante ter junto esse pessoal até para que eles possam dar continuidade a essa cultura quando entrarem na universidade”.
Além disso, como cada edição da atividade ocorre em um espaço diferente da universidade, há também o impacto de fazer com que pessoas e espaços conheçam a cultura da periferia. Exemplo disso foi uma edição que ocorreu na Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FEA). “Tinham pessoas ali que nunca haviam tido contato com alguém da periferia de uma forma potente. Pelo menos não enquanto iguais. A gente está muito nas nossa bolhas e levar a cultura da periferia para esse espaço, fazer com que eles nos escutassem, o que queríamos, o que pensávamos, foi muito simbólico.”
Outra potência dos encontros – que hoje costumam acontecer mensalmente – estão nos debates que precedem as competições de poesia falada. É comum ocorrer rodas de conversa sobre diversos temas como racismo, machismo e, inclusive, acerca da ocupação e ressignificação do espaço da universidade pública.
“A gente preza muito por esse caráter educativo do slam, até porque sabemos que estamos na universidade que é um espaço ainda muito privilegiado da educação. E o slam nos dá essa oportunidade de narrativa, por isso falamos em espaços negados que agora estão ocupados.”
O Movimento de Inovação na Educação apoia a iniciativa Leadyoung – Histórias de Jovens que transformam, que conta histórias de jovens ou de adultos que começaram a transformar na juventude, identificando um problema que os sensibiliza, organizando equipes em torno de soluções para enfrentar o problema e, assim, produzindo impacto social. Conheça essas histórias. Você é ou conhece alguém que tem uma história de transformação social? Conte-nos através deste formulário.