Hugo, de apenas 21 anos, conhece bem a comunidade de Coroadinho, na ilha de São Luís (MA). Sabe onde estão os comércios, os açougues, e também quais as famílias e territórios mais afetados pela pandemia de Covid-19 (novo coronavírus).
O conhecimento territorial e afetivo do estudante de pedagogia é vital para o projeto Central de Atendimento Jovem, articulado pelo Instituto Formação e por uma rede de outros sete jovens de comunidades periféricas maranhenses.
“Nós, jovens, dialogamos com famílias de cada um dos territórios para saber quais suas necessidades e como podemos articular doações e serviços com o bairro para atendê-las”, elucida Hugo.
O jovem é também ponte entre a comunidade e o Instituto Formação, que custeia os fundos e também celulares e internet para a logística do trabalho, tudo a depender das especificidades de cada território, como explica Diane Pereira Sousa, gerente de projetos da organização
“Nós atendemos a necessidade de uma comunidade que precisa ser escutada: a do estudante que parou de estudar, da chefe de família que não consegue mais trabalhar, do idoso e da criança. E quem melhor para construir esse diálogo do que o jovem que mora na comunidade?”
Embora nascida emergencialmente, a central conta com rapazes e moças que trabalham com seus territórios há bastante tempo. Eles são parte do programa Escola de Mediação, um projeto formativo de liderança juvenis em direitos humanos, políticas públicas e gênero.
No começo do ano, o programa estava para lançar um livro sobre sua trajetória, mas o cenário da pandemia alterou o cronograma. Com o isolamento social decretado, o Instituto Formação voltou esforços para a criação da central.
Desde o dia 16 de março, Hugo faz um mapeamento afetivo e cuidadoso dos moradores de uma parte de Coroadinho – outro jovem é responsável por uma segunda região, já que a comunidade é grande. Usando contatos prévios, ele conversa virtualmente com as famílias para entender o que precisam.
“Nós não entregamos uma cesta básica com itens que a família já tem. No mapeamento do nosso bairro, percebemos uma necessidade de itens de açougue e de limpeza como sabão, então é nisso que nos concentramos”, explica o jovem.
Cada família recebe então as “solidárias”, moeda local para gastar em comércios parceiros. São jovens líderes que coordenam a entrega destes vales, de modo a evitar aglomerações e deslocamentos desnecessários.
“O que é básico para você não é para mim, por isso a cesta básica nem sempre funciona. A moeda possibilita que a pessoa possa comprar os alimentos de forma mais abrangente e afetiva. É justamente imaginar que todo mundo é igual e desenhar a política pública assim que aumenta a curva de desigualdade”, arremata Diane.
A relação que estes jovens mantêm com o território possibilitou a flexibilização do modo de vender de açougues, mercados e padarias: além das moedas solidárias, eles conseguiram que o comércio local vendesse produtos em unidades ou quantidades menores.
Depois de um mês de iniciativa, que além de atender demandas locais também conseguiu arrecadar dinheiro para a próxima fase do projeto, a Central de Atendimento Jovem entra nos próximos 30 dias de execução.
As iniciativas estão sendo documentadas nas redes sociais tanto do Instituto Formação quanto dos jovens, que postam semanalmente vídeos sobre o processo de articulação, além de se disponibilizar para atender dúvidas de moradores de seus bairros.
“Esses jovens passaram por um processo formativo dentro do Instituto Formação, da escola, da universidade. Entendem de economia, são jovens negros, gays, lésbicas, com uma grande consciência de comunidade. Foi muito importante para o instituto colocar essa pauta de redução do impacto do COVID-19. Tem sido o maior desafio de aprendizado para eles”, conclui Diane.
*Texto publicado originalmente no Portal Aprendiz, de autoria de Cecília Garcia