22/04/2021
Por José Pacheco
Torre de Moncorvo, 21 de abril de 2041
Há vinte anos, o meu amigo (e sábio) Isaac Roitman lembrava aos seus conterrâneos que, no dia 21 de abril, a sua “querida UnB” completaria 59 anos de existência.
Percorramos uma “linha do tempo”. No quinquagésimo aniversário da universidade, foram comemoradas “conquistas, identificando os fracassos e as omissões” e a “Comissão UnB.Futuro” surgiu, para pensar a universidade de outro meio século. Na década de cinquenta do século passado, acadêmicos sentiram “necessidade de uma inflexão no ensino universitário brasileiro”. Mas, se o que se pretendia fosse inovação, sofreu o desgaste registrado no livro “A Universidade Interrompida 1964-1965”. Nos idos de sessenta, no seu depoimento à Comissão Parlamentar na Câmara dos Deputados, o português Agostinho da Silva defendeu um modelo da universidade, que enfrentasse os desafios dos tempos presentes (década de sessenta) e futuros:
“A Universidade atual, que vem da Universidade medieval, é uma Universidade que se alicerça sobre a ideia de fraternidade, de esforço comum, para atingir uma verdade, que não é uma verdade puramente intelectual, mas uma verdade de sentimentos, de unidade entre os homens. O grande drama da Universidade brasileira, hoje, é que estamos tentando implantar no Brasil estruturas que são efetivamente de outras economias, de outros estágios educacionais e que de maneira nenhuma podemos adaptar ao Brasil”.
Nesse corajoso discurso perante a Câmara, Agostinho da Silva denunciou a falta da liberdade e da autonomia, gerada pelo “regime de medo”, que fazia com que a Universidade não pudesse cumprir a sua missão criadora. Em pleno “maio de 68”, num ano em que o mundo passou por profundas transformações, Agostinho vaticinava aquilo que viríamos a vivenciar, algumas décadas depois:
“Cada vez creio mais que o Brasil é de todas as nações aquela que mostra no mundo, neste momento, mais capacidade criadora, mais capacidade humana, mais possibilidade de convivência. Mas, de nenhuma maneira nós podemos ter a esperança de ter uma Universidade nova, se não tivermos um Brasil novo”.
Volvido meio século, um novo “regime de medo” se instalou. Nesse tempo de negacionismo, sinais de ressurgimento criador surgiam. Face à pandemia da Covid-19, mais de trezentos projetos foram desenvolvidos na UnB, para enfrentar a crise sanitária. O sonho de Anísio e Darcy, não morrera. Outros insignes mestres o retomaram: Luís Pereira, Vladimir Carvalho, Aldo Paviani, Adalgisa Rosário, José Coutinho, Isaac Roitman e outros vultos, que tive oportunidade de conhecer. A UnB “estava viva”. Contudo, resquícios de “regimes de medo” afetavam a universidade, corroendo o sonho de Darcy, ignorando a reflexão de Agostinho:
“A Universidade não é capaz de responder mais aos anseios da juventude, que quer encontrar um estímulo de criação, alguma coisa que a encaminhe para o mundo e não encaminhe apenas para a sua profissão”.
Nos idos de vinte, essas palavras ressoavam carregadas de triste atualidade. A administração educacional se constituía em obstáculo à inovação. Na universidade, a formação dos educadores permanecia ancorada em práticas instrucionistas. Uma educação arcaica reproduzia uma sociedade arcaica.
Freire havia dito que a escola não mudaria a sociedade, que a escola mudaria as pessoas e que as pessoas mudariam a sociedade. Porém, se a sociedade não mudava a escola, onde estaria a escola que mudaria as pessoas? Onde encontrar pessoas capazes de mudar a sociedade? Como seria possível interromper o círculo vicioso dos “regimes de medo”?