Desde o início da humanidade, a curiosidade e a necessidade de compreender os fenômenos cotidianos mais diversos como o dia e a noite ou as estações do ano fizeram com que gerações e gerações olhassem para cima em busca de respostas. Séculos e muitos avanços científicos depois, a misteriosa dança de estrelas e astros pelo universo continua a encantar e provocar jovens como Carlla Vicna, de 20 anos, estudante de engenharia da computação na Universidade Federal do Amazonas (UFAM).
Carlla é a criadora do Projeto Cosmos, que visita escolas públicas para ensinar Astronomia de forma criativa, com o objetivo de democratizar o acesso às ciências e fomentar uma mentalidade questionadora entre os estudantes.
Tudo começou quando a estudante estava no 1º ano do Ensino Médio e se inscreveu para participar da Olimpíada Brasileira de Astronomia e Astronáutica. “Sempre estudei em escolas públicas de Manaus e até então eu nunca tinha ouvido falar dessa olimpíada. Então meu professor explicou e mostrou materiais para estudar. Conforme comecei, fui me empolgando e percebi que quanto mais eu estudava, mais me encantava porque aquilo estava satisfazendo minha curiosidade sobre o mundo”, conta.
Aos poucos, o desconhecimento sobre o tema deu lugar para uma nova paixão. “Poder identificar constelações no céu e entender os eventos que acontecem por conta do movimento dos corpos celestes foi me dando uma sensação de que eu estava finalmente entendendo o mundo a minha volta e isso me fez querer entender ainda mais coisas. É um sentimento de empoderamento”, explica.
O fascínio pelo tema foi tamanho que Carlla saiu da competição com uma medalha de bronze e a vontade de despertar o interesse pela Astronomia em outros jovens. Junto a colegas da universidade de diversas graduações, fundou o Projeto Cosmos, que realiza desde preparatórios para olimpíadas até palestras, oficinas, brincadeiras e jogos para escolas e comunidades.
“O Cosmos é formado por um grupo de jovens que estudaram nas escolas púbicas e que agora estão voltando para elas para oferecer um conteúdo que agrega. Ele contribui para uma educação inovadora por ser uma construção da sociedade que traz mais diversidade para dentro da escola. Para mim, é um ato político e social ocupar esse espaço.”
Nesta perspectiva, traz novas abordagens e possibilidades de interação com os professores. “Estamos criando metodologias de ensino nas nossas oficinas para que professores de diferentes localidades possam, usando o contexto da astronomia, modificar e aplicar em sua aulas”, acrescenta a estudante.
Outro mérito do projeto está no fato de funcionar como uma porta de entrada para a aproximação dos jovens com outras ciências.“A astronomia é multidisciplinar. Fala de Química, Física, Biologia, Matemática, entre outros. Então, temos uma aula de Astronomia e Química, por exemplo, para falar da composição das estrelas. Outra de Matemática para falar da escala dos planetas no sistema solar. As crianças e jovens se encantam e a gente usa esse encantamento para mostrar como a ciência é divertida, fantástica.”
O campo do conhecimento também é usado com o objetivo de mostrar a importância do pensamento científico para a construção do conhecimento. “Acho que é muito importante, na atual conjuntura do país, resgatarmos os valores da ciência, que nada mais é que fazer o aluno se questionar, ter senso crítico, estruturar como ele vai encontrar respostas – é formulando hipóteses, fazendo experimentos? Procurando em quais fontes? São confiáveis? Então a gente quer que os alunos façam perguntas e que tenham uma responsabilidade na hora de encontrar as respostas.”
Para Carlla, ações como estas têm se mostrado cada vez mais necessária diante de factoides que voltam a ganhar adeptos. “Hoje, têm diversos movimentos questionando se a terra é redonda. Essas pessoas não estão refletindo sobre a informação que recebem, porque não dá para acreditar em algo que não tem evidência nenhuma. Assim, quando estamos levando a astronomia, também refletimos sobre essas questões, sobre todo o processo de como se constrói ciência.”
A desigualdade de gênero nas áreas científicas também é problematizada, apesar do grupo ter sido concebido por uma maioria de voluntárias mulheres. “Essa desigualdade se manifesta claramente quando abordamos a história da ciência. A maioria das figuras são homens. Ainda há muitas barreiras dentro da academia para uma mulher cientista. Então fazemos questão de falar que as mulheres podem ocupar essas áreas, que isso não ocorreu por conta de um machismo estrutural.”
Atualmente, o projeto Cosmos conta com 28 voluntários e é oficialmente um projeto de extensão da UFAM. Sua preocupação com a inovação na educação pública tem gerado diversos frutos, mas para Carlla o maior deles é o prazer que crianças e jovens sentem ao fazer suas descobertas astronômicas.
“Uma educação inovadora é uma construção de diferentes visões, que vai além da transmissão de conteúdo, focando na construção do conhecimento. E não só no conhecimento, mas nas vivências que estão ao redor daquilo. O nosso principal objetivo é que o momento do aprendizado seja divertido, seja prazeroso”, conclui.
O Movimento de Inovação na Educação apoia a iniciativa Leadyoung – Histórias de Jovens que transformam, que conta histórias de jovens ou de adultos que começaram a transformar na juventude, identificando um problema que os sensibiliza, organizando equipes em torno de soluções para enfrentar o problema e, assim, produzindo impacto social. Conheça essas histórias. Você é ou conhece alguém que tem uma história de transformação social? Conte-nos através deste formulário.