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Sou professora de História em Bituruna, cidade paranaense com cerca de 16 mil habitantes, conhecida como a terra do vinho.
Trabalho na rede pública há 26 anos e sempre acreditei que os obstáculos do cotidiano escolar podem se transformar em oportunidades de aprendizagem. Observei alguns estudantes com baixa estatura e baixo peso, possivelmente relacionados à alimentação inadequada.
Alimentos ultraprocessados estão por toda parte. Mesmo entre famílias que vivem no campo e que têm acesso a frutas, legumes e verduras frescas, o consumo desse tipo de alimentação, tão prejudicial à saúde, ainda é exagerado.
Conheça os projetos selecionados semanalmente nesta 3ª edição do Prêmio Professor Porvir
Em conversas com o professor de Ciências, Cleonir Ferreira de Castro, percebemos que muitas famílias consumiam muitos salgadinhos e biscoitos, e que a falta de tempo e de conhecimento sobre como preparar pães mais nutritivos dificultava a mudança de hábitos. Dessa escuta nasceu a ideia do projeto, que uniu uma necessidade da comunidade escolar a algo muito presente na minha vida.
Fazer pão sempre foi, para mim, um gesto de criação, cuidado e afeto: acalma quando estou nervosa, celebra quando estou feliz e me inspira a testar novas cores, sabores e nutrientes. Costumo dizer que fazer pães é minha segunda paixão e, ao lecionar, encontrei a oportunidade de unir essas duas alegrias. A minha cozinha se tornou a extensão da escola, e os meus pães, a tradução do amor que tenho por ensinar. Assim surgiu o projeto “O Pão Nosso de Cada Dia”, desenvolvido com a turma do 8º ano do Colégio Estadual do Campo Irmã Clara.
O projeto está alinhado às áreas de ciências, história e linguagens. Com ele, eu quis compreender o valor nutricional de ingredientes locais, refletir sobre os malefícios dos industrializados e recuperar a história do pão, desde suas origens até a presença marcante na imigração italiana da região.

O objetivo foi incentivar escolhas alimentares mais saudáveis de uma maneira ampla. A minha intenção foi que os estudantes percebessem o pão como um elemento cultural, histórico e sensorial, capaz de contar histórias, trazer memórias e transformar hábitos. Além disso, a proposta buscou aproximar escola e famílias, estimulando um diálogo mais próximo entre gerações.
Para começar, organizei uma aula sensorial. Com os olhos vendados, os estudantes foram convidados a tocar e experimentar diferentes tipos de pães feitos por mim. Preparei receitas com ingredientes da própria região: abóbora, pinhão, aipim, erva-mate, beterraba, couve, uva e brócolis. A ideia era ativar sentidos e curiosidades, mostrando que o pão pode ter múltiplas cores, sabores e nutrientes. A turma se surpreendeu ao descobrir que o pão laranja tinha abóbora e o verde era feito com couve.
Enquanto explorávamos sabores, estudávamos também a jornada histórica do pão. Falamos do pão ázimo, que é assado sem fermento e feito de farinha de trigo ou de outros cereais, como aveia, cevada, centeio e água. Estudamos a evolução das técnicas de preparo, os hábitos alimentares trazidos pelos imigrantes italianos e as tradições que se mantêm vivas nas famílias de Bituruna. Em paralelo, o professor de Ciências aprofundou o estudo dos nutrientes presentes nos ingredientes locais e os impactos dos ultraprocessados na saúde.

Inspirada na Pirâmide da Aprendizagem do psiquiatra norte-americano William Glasser (1925–2013), que mostra que aprendemos melhor quando praticamos, discutimos e colocamos o conhecimento em ação, percebi que envolver os estudantes e suas famílias tornaria o aprendizado mais efetivo.
Convidei a turma para registrar memórias, conversar com pais e avós e recuperar histórias sobre alimentação, imigração, cultivo e tradições locais. O que começou como uma atividade simples se transformou em um espaço de troca. Muitos pais relataram lembranças da infância, compartilharam receitas antigas e reencontraram histórias que já não recordavam. Esses registros se transformaram em uma espécie de diário, que” virou uma ponte entre gerações.
O envolvimento da comunidade ampliou o alcance do projeto. Convidei uma nutricionista para dialogar com pais e estudantes sobre os malefícios dos industrializados e as possibilidades nutritivas de ingredientes locais. Também fiz excursões: levei a turma para conhecer empreendedores rurais e produtores da região: o Ateliê Dona Formiguinha e a Vinícola e Museu Casa Sanber, que compartilharam suas experiências e mostraram como o trabalho no campo pode ser fonte de renda e organização da vida familiar.

Os relatos da professora Cleusa Sonálio e de Sônia Maria Zembruski Isoton ampliaram a visão dos alunos sobre o empreendedorismo no meio rural. Cleusa, professora aposentada muito respeitada na comunidade, trouxe memórias de quem sempre viveu e lecionou no local. Sônia Maria Zembruski Isoton, empreendedora reconhecida pelo Sebrae e proprietária do Ateliê Dona Formiguinha, compartilhou sua experiência no desenvolvimento da Pane Radici, referência turística de nossa cidade.
Ao longo do processo, percebi o envolvimento dos estudantes crescer a cada atividade. Eles documentaram etapas, participaram das análises sensoriais, investigaram valores nutricionais e produziram receitas.
Um dos pães preferidos da turma foi o “Brasileirinho”, com massa verde (couve, espinafre e brócolis) e amarela (abóbora). Outro destaque foi o “Bituruninha”, inspirado na produção local de Bituruna, combinando erva-mate, uva e abóbora. A turma também criou versões especiais para pessoas com intolerâncias alimentares. As atividades incluíram degustação de pães variados, visitas a empreendimentos locais, aulas de campo e palestras com profissionais, além da participação das famílias em dinâmicas e orientações nutricionais. O projeto ainda incentivou o empreendedorismo, mostrando como o pão artesanal pode se tornar fonte de renda, cultura e identidade.

A limitação física da escola foi um desafio. Não podíamos fazer os pães no espaço escolar, então levei o projeto para minha casa. Gravei vídeos e tirei fotos de cada receita e compartilhei tudo por meio de um grupo de WhatsApp que reúne estudantes e responsáveis e pelas redes sociais da comunidade. Isso permitiu que os alunos visualizassem o preparo e tivessem mais segurança para reproduzir as receitas em casa. Também criei o “Desafio Fazendo Pão em menos de 15 Minutos”, para mostrar que o tempo não precisava ser um obstáculo.
Os impactos foram concretos. Muitos estudantes passaram a substituir ultraprocessados por alimentos caseiros, como feijão, arroz, polenta, carnes e saladas. As famílias também começaram a preparar pães com mais frequência, utilizando abóbora, aipim, pinhão e outros ingredientes que sempre estiveram disponíveis, mas pouco valorizados.
Também houve avanços pedagógicos: os alunos compreenderam a história do pão, aprofundaram conhecimentos de Ciências e desenvolveram habilidades de leitura e escrita no “Diário de Família”.

Na escola, a iniciativa foi elogiada na reunião escolar do fim do trimestre e se tornou um exemplo de como a Educação do Campo pode mobilizar saberes locais e fortalecer vínculos comunitários. Criamos laços mais fortes entre a escola e as famílias, e abrimos caminhos para que os alunos reconheçam a força dos saberes rurais.
Hoje sinto que o projeto deixou um legado. O “Pão Nosso de Cada Dia” não foi apenas uma sequência de atividades, mas uma prática que integrou história, alimentação e participação familiar. Foi um convite para olhar para o que nos alimenta e para o que podemos transformar no presente.
Levo comigo a convicção de que a escola é um espaço de aprendizagem conectado ao território e capaz de gerar mudanças com elementos simples do cotidiano.
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